Lisbon from the chapel hill of Nossa Senhora do Monte, Drawn by Lt. Col. Batty, 1830. Imagem: Biblioteca Nacional de Portugal |
Quando em julho abrira Lisboa as portas á divisão liberal [v. Almada Virtual Museum: Guerras Liberais], principiaram os habitantes a correr às armas, e foram-se organisando os batalhões de voluntários fixos e moveis [...]
Solicitando porém no principio de agosto auctorísação do imperador, e recebendo-a para executar o que entendesse, forçou as linhas sitiadoras do Porto a 18 de agosto, e libertando-o como o tinha salvado, pôde immediatamente realisar o complemento do seu grande plano, correndo a Lisboa, trazendo uma valorosa divisão, trazendo-se a si próprio, e chegando exactamente quando o perigo, pelos motivos expostos, ia ser tremendo.
Logo no dia immediato o imperador e elle correram os arrabaldes [...]
Lisbon, published under the superintendence of the Society for the Diffusion of Useful Knowledge. Drawn by W B Clarke, engraved and printed by J Henshall Published by Baldwin & Cradock 47 Paternoster Row, 1833. Imagem: Lisboa de Antigamente |
Mas eis que se approxima o exercito realista, e defronta com Lisboa no dia 3 de setembro. Estabelecida se acha a grande linha realista contra a grande linha constitucional.
Cairá Lisboa, ainda insufficientemente fortificada por falta de tempo, diante do desproporcionado exercito que a vem conquistar? [...]
Ás cinco bens e meia da madrugada n'aquelle dia 5 de setembro, onze mil homens em seis columnas saem das linhas realistas para irromperem as constitucionaes. Ameaçando o centro pelo Campo Pequeno em breve se conheceu qne era por ali um ataque falso.
Na sua direita, porém, bifurcando-se, ao deixarem Sete Rios, uma parte da força investiu pela estrada de Campolide, outra pela de Palhavã; aquella para auxiliar o movimento pelo flanco direito, esta para tomar a quinta Louriçal, e d'ella passar para a quinta do Seabra (quinta Bahia).
Linha de defesa da cidade de Lisboa, 1835. Imagem: Biblioteca Nacional de Portugal |
Infelizmente para os atacantes o grande reducto da Atalaya (ponto importantíssimo das posições liberaes) dominava as estradas investidas de Campolide e Palhavã.
A columna realista que proseguia para Campolide, nao podendo romper, deixa de auxiliar o movimento da sua companheira de Palhavã, e assiste á batalha sem intentar novos accomettimentos.
É a brigada realista e imponente do valoroso coronel Dubreuil que vem atacar em Palhavã o palácio e jardim Louriçal com a mira na quinta, e d'esta para a do Seabra [...]
Tinham sido vencidos por Saldanha os generaes seus patridos; acabavam de o ser os generaes francezes [...]
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Nao se parecia com um rio; era o Tejo um salão de crystal. Meia Lisboa se cruzava n'elle. Outra parte da população lhe bordava as margens.
Battle of Cape St. Vincent of 1833. A squadron of Portuguese frigates commanded by British Admiral Napier on behalf of the Queen Maria Liberal faction defeated King Miguel’s Absolutist squadron, in the Portuguese Civil War Imagem: The Westphalian Post |
Esquadra portugueza, esquadras de Inglaterra e de França, embarcações mercantes, fragatas, faluas, barcos de todas as praias na extensa linha e em todas as direcções, quantas musicas tinha a cidade compondo a orchestra d'aquelle salão immenso, as senhoras de azul e branco, os homens com seus trajos de festa, o enthusiasmo em todos os corações, a curiosidade em todos os rostos, e o sol abrilhantando o espectáculo: tal corria a manhã d'aquelle dia 23 de setembro de 1833.
E o que é que, despovoando a capital sitiada, levava ao Tejo n'aquelle delírio os habitantes, desde o imperador até o cidadão mais humilde?
Barra dentro havia entrado na vespera a rainha que symbolisava a constituição dos portuguezes.
Quem era? uma menina. D'onde vinha? da proscripção. Que demandava? um sceptro que desencadeava algemas. Três coroas lhe cingiam a fronte juvenil: a inocencia, a desgraça e a emancipação dos povos. A innocencia tornava-a sympathica; a desgraça, heróica; a emancipação das gentes fazia-a adorável.
Rainha D Maria II, 1833. Imagem: Wikipédia |
Já corria pelo Tejo todo o como ella era. Gentil, como os seus quatorze annos; a pelle, setim; a côr, alva; olhos, celestes; cabellos, como o oiro; porte nobre; rosto reflexivo; no olhar, o sobresalto do que via; no sorriso, o prazer de ser ali o culto de todos.
Sobre o Tejo saudavam-na as salvas das torres, das esquadras, dos fortes. Na cidade esperavam por ella os batalhões nacionaes e a povoação. Quantas mães lhe não tinham sacrificado os filhos! [...]
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No dia 24 [de maio de 1834] quando o marechal Saldanha em Montemor o Novo (a um dia de marcha apenas) ia atacar os restos do inimigo em Évora, recebe um officio do general realista Lemos, pedindo um armistício, e mandando-o também pedir ao duque.
Kssssse! Pédro - Ksssse! Ksssse! Miguel! Gravura, Honoré Daumier, 1833 Imagem: Biblioteca Nacional de Portugal |
Terceira continuou a marchar sobre Extremoz. Saldanha respondeu-lhe que para dar mais uma prova do horror com que tinha visto derramar o sangue portuguez fazia alto n'aquella villa, de Montemor, mandando pedir ao duque da Terceira, a quem animavam os mesmos desejos, para vir ali, a fim de o ouvirem ambos; mas impreterivelmente no dia seguinte.
Consultado logo por Saldanha o governo, sobre o armistício, o governo recusou-o, ordenando que o exercito realista depozesse incondicionahnente as armas.
Saldanha continuou a marcha sobre a cidade de Évora, fez alto com a sua divisão, no dia 26, em Arrayolos e Évora Monte para dentro em quatro horas, de combinação com o duque da Terceira, cair definitivamente sobre o inimigo, e de todo o aniquilar, quando n'esse mesmo dia se apresentou o general Lemos, tendo dado a sua causa por vencida.
Á noite foi assignada em Évora Monte a convenção pelos dois marechaes e por aquelle general. O imperador decretava a amnistia e as estipulações da mesma convenção [v. Wikipedia (en)].
No dia 30 o marechal Saldanha entrava na cidade de Évora e perante elle depunha as armas o exercito realista. No dia 31 occupavam a praça de Elvas as forças do duque da Terceira, que, a três léguas d'aquella praça, tinha o seu quartel general na Azaruja.
S.M.I. o Senhor D. Pedro
restituindo sua Augusta Filha a Senhora D. Maria Segunda e a Carta Constitucional aos Portugueses, Nicolas-Eustache Maurin,1832. Imagem: Wikipédia |
Terminara a lucta, e vencedora ficava, para nunca mais perecer, a liberdade portuguesa. (1)
(1) D. António da Costa, História do Marechal Saldanha, Tomo I, Lisboa, IN, 1879
Tema:
Guerras Liberais (LeoT)
Guerras Liberais (AVM)
Mais informação:
Guerra Civil Portuguesa
António Avelino Amaro da Silva, O Caramujo..., Lisboa, Typ. Universal, 1863
Cronologia do Liberalismo
Charles Napier, An account of the war in Portugal between don Pedro and don Miguel, 1836
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