O Grupo do Leão (detalhe), o Manuel em destaque ao centro, Columbano Bordalo Pinheiro, 1885. Imagem: MNAC |
Porque o sr. Manuel não ensina aos artistas coisa nenhuma, não lhes marca falta na pauta, nem lhes diz asneiras tossindo de papo, arrotando-lhes estethica por detraz do hombro, e gesticulando para o modelo com a bola do pão ou com o carvão em pitada entre os dedos.
O sr. Manuel contenta-se em se lhes rir para os quadros com uma bondade espirituosa, em lhes servir á mesa nos jantares do restaurante, e, segundo nos affirmam pessoas fidedignas, — em lhes fazer credito.
A cervejaria Leão d'Ouro, inaugurada em 16 de abril de 1885, desenho do natural por João Ribeiro Cristino. Imagem: Hemeroteca Digital |
Se isto assim é, — so effectivamento tu fazes credito, ó magnanimo Manuel! Ó meço sublime! eu que estas regras escrevo, te bendigo o ti: abençôo, porque n'esta terra de falsos mecenas, de falsos mestres o do falsos criticos, tu és o verdadeiro, o unico protector das nobres artes.
Palavriado temos ouvido muito; cruzes do lagarto quantas se queiram; de alimentos — nada!
Manuel da cervejaria Leão, Raphael Bordallo Pinheiro, 1881. Imagem: Hemeroteca Digital |
Fazendo credito simplesmente, tu prehenches os nossos votos mais caros. O que é futuro todo d'um artista Portugal senão isso: — a perspectiva d'ouro do bife com batatas ou da costeleta com hervas, affiançada por quinze dias! Podémos adormecer em paz, meus senhores.
A arte tem de comer, Deus existe, Manuel vela! (1)
O Grupo do Leão, Columbano Bordalo Pinheiro, 1885. Representados, da esquerda para a direita: em fundo, João Ribeiro Cristino, Alberto de Oliveira, criado Manuel, Columbano, criado António, Braz Martins; sentados, em segundo plano, Manuel Henrique Pinto, João Vaz, Silva Porto, António Ramalho, Rafael Bordalo Pinheiro; em primeiro plano, José Malhoa, Moura Girão, João Rodrigues Vieira. Imagem: MNAC |
Emfim é d'esta meza servida, protegida, defendida, pelo Manuel, um dos criados da "brasserie", de grandes suissas pretas, e que, á força de convivencia com umas poucas de camadas de artistas, que tem passado por aquella meza tradiccional, dá opiniões sensatas, outras vezes um tanto arrojadas — sr. Manuel! — sobre as estampas das illustraçães e acompanha, sem nunca desafinar, em todos os coros que o grupo levante, ou de indignação por algum acto que podesse rebaixar a arte, ou de applauso por algum novo trabalho revelador de merito. (2)
(1) [Ramalho Ortigão?] O António Maria n.° 134, 22 de dezembro de 1881
(2) Marianno Pina, O Grupo do Leão, Diário da Manhã, 15 de Dezembro de 1881
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